É duro ouvir um “Não”

Nestas últimas semanas andámos aqui a recrutar um copy. Felizmente já o encontrámos e estamos agora a fechar os pormenores da contratação.

Como podem compreender, é-me humanamente impossível dar feedback personalizado a toda a gente. É uma coisa que me chateia, por isso escrevi este texto longo e chato. Foi a forma que encontrei para tentar retribuir um pouco a todos os candidatos que levaram um não.

Então recebemos mais de 60 candidaturas neste processo de recrutamento. Um número que nos impressionou bastante, especialmente tendo em conta a forma como conduzimos o processo – com um conjunto de exercícios que “dão mais trabalho” do que simplesmente enviar um CV e um Portfolio.

Começando pelo princípio, lançámos 3 exercícios. Para quem não os apanhou, estão aqui. O processo de candidatura consistiu em resolver um, dois ou os três desafios. É importante referir que não haviam respostas certas nem erradas – e que os desafios que cada candidato escolheu para resolver foram desde logo uma grande ajuda para compreender a motivação e o empenho de cada um.

Posto isto, acredito que compreender os exercícios poderá ajudar-vos em situações semelhantes no futuro e por isso passo a explicá-los um pouco melhor.

O primeiro exercício consistiu em resumir um texto para praticamente metade do seu tamanho original. O objectivo: avaliar a capacidade de sumarizar e sintetizar, a capacidade de reter as ideias essenciais e o equilíbrio entre usar palavras e expressões novas – ou manter as originais.

O segundo exercício consistiu em resolver um briefing mais ou menos semelhante aos que encontramos no dia-a-dia. O exercício foi concebido para avaliar várias coisas diferentes: a) a capacidade de interpretar correctamente um briefing e de perceber exactamente o problema em mãos; b) a criatividade para encaixar ideias antagónicas (pais, filhos e sexo) tanto no conceito como na mecânica de funcionamento; c) a capacidade de criar um nome; d) a capacidade de explicar claramente uma ideia por escrito; e) o conhecimento do formato Facebook Ad (e/ou a vontade de investigar as limitações deste formato); f) por último, mas não menos importante, as recomendações genéricas para este hipotético cliente – revelaram um pouco da costela estratégica de cada candidato.

O terceiro exercício consistiu em criar três posts ou conteúdos “social media”, sob um mesmo tema, para três das marcas que trabalhamos actualmente. São marcas muito diferentes no seu tom e o objectivo foi avaliar tanto a versatilidade criativa como a capacidade de adequação ao tom que as marcas já praticam.

Lançado o desafio, a grande maioria das candidaturas vieram de pessoas com alguma experiência na área. Realmente impressionante foi o facto de um quarto dos candidatos que se empenharam em resolver os exercícios trabalharem e/ou terem experiência não nesta área, mas noutras completamente diferentes: Museologia, Banca, Finanças, Gestão e Administração, Recursos Humanos, Fisioterapia e Massagem, Jornalismo, Rádio, Guionismo, Realização, Encenação, Interpretação Artística, Música e até Comédia.

No meio disto tudo, para todos os candidatos que ouviram um não – mas especialmente para vocês, pessoas que (ainda) desconhecem a vida numa agência – gostaria de deixar uma mensagem de incentivo.

Sejam duros e nunca desistam.
Pelo que se vê nos case studies e blogs das agências, é fácil imaginar que esta é uma profissão encantadora: que temos a informação e o tempo que são precisos para pensar nos problemas, para ter algumas ideias assim-assim e para chegar a uma grande revelação “shã-nããã” que toda a gente (incluindo o cliente) compreende, concorda, aceita e compra.

Era bom que assim fosse e sim, até há algum glamour no meio disto tudo. No fundo usamos mais t-shirts, ténis e óculos de massa do que a maioria, trabalhamos num ambiente menos formal e com pessoas mais coloridas – e às vezes até aliviamos algum do nosso stress de formas menos convencionais.

Mas a realidade é que a vida nesta área é difícil e fazer isto todos os dias é mais duro do que parece.

Diária e consistentemente temos de criar e apresentar muitas, muitas ideias. Até aqui tudo bem. Só que a maior parte dos “nossos bebés” acaba literalmente no lixo sem dó nem piedade – e uma boa parte das ideias que sobrevivem acabam mutiladas ou deformadas no processo. Um criativo de profissão tem de dominar, antes de tudo o resto, a rejeição e a frustração. Tem de canalizar essa energia para fazer melhor da próxima vez – e viver com (alguma) sanidade mental até ao próximo dia. Tem de ser duro e nunca desistir.

Isto porque para muitos, muitos dias de suor e lágrimas há, de quando em vez, um dia bom. O dia em que o teu melhor trabalho sai para a rua (mais ou menos) ileso. O dia em que “a internet” reage como previste ou ainda melhor, com mais emoção. O dia em que o teu director, o teu cliente, o teu público, a tua concorrência e até a tua avó te dão os parabéns, porque fizeste qualquer coisa que tocou as pessoas, que as fez pensar, que ajudou a resolver um problema ou a vender um produto que vale a pena. Nesse dia, este é o melhor trabalho do mundo.

A imaginação treina-se, a criatividade aprende-se e a escrita pratica-se.
A dureza não. A dureza tem que nascer com vocês.
Por isso sejam duros e nunca desistam.
Os dias bons não tardarão em chegar.

Obrigado a todos por alinharem nesta maluquice.

1 Comentários a É duro ouvir um “Não”

  1. By Carla on June 17, 2014

    Li até ao fim! Não posso dar melhor elogio (nos dias que correm, em que 10 linhas corridas são um desafio).

    Boa sorte ao novo Wizard, bjis para vocês

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